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Missão: música!
 
Missão: música!
 
O FIB não é apenas um festival de Verão. É um conjunto de missões. Claro que é humanamente impossível assistir a tudo e muitas vezes os ingratos alinhamentos dos artistas conseguem sobrepor concertos que sempre se desejou ver. Para conseguir cumprir o máximo de missões há utensílios essenciais que devem fazer parte do kit de sobrevivência: um relógio e o programa diário do festival (e um marcador florescente para aqueles que só assim conseguem delinear a estratégia de ataque musical).

Com o cartaz sempre à mão e o relógio certo, dia 6 de Agosto é o primeiro dia de acção de todos os palcos do FIB.
Ao final da tarde os Snow Patrol deram início às actuações escocesas do FIB 2004. Outrora os Snow Patrol eram uma banda discreta, com pequenas aspirações e bons álbuns relativamente escondidos. Hoje os Snow Patrol deixaram de ser uma banda para os amigos e os amigos dos amigos. Conhecendo bem as fórmulas da canção pop, apostaram em transformar-se nuns Coldplay menos irritantes, com bons singles e até presenças nos tops ingleses. E conseguiram. O concerto oscilou entre os agradáveis momentos de canções com refrões eficazes, os inevitáveis singles cantaroláveis e óptimos para os compassos de palmas adorados pelo público espanhol, que apesar de não serem perfeitos não são escusados e os momentos enfadonhos em que a atenção facilmente se afasta do palco. Os temas “How do be dead”, “Spitting Games” e o famoso “Run”, do seu último álbum “Final Straw” ficaram com certeza marcados na memória do público. O resto, talvez.

Sem tempo para grandes pausas entre concertos, os Kings os Leon subiram ao palco “Fiberfib.com” imediatamente após os Snow Patrol. Os três irmãos e um primo, que em 2003 se estrearam com o revivalista “Youth and Youth Manhood”, provaram, em poucos minutos, que não são um produto de marketing. Apesar do ar imberbe do baixista, das roupas, dos penteados e das barbas que evocam claramente os anos 70, os Kings of Leon não têm qualquer semelhança com os inenarráveis Kelly Family. Durante 50 minutos acreditamos estar perante uns Deep Purple em início de carreira e os riffs de guitarra ganham vida própria, apetecendo cantar os solos e fazendo esquecer o nem sempre afinado tom de voz do vocalista. “Red Morning Light”, “Molly’s Chamber” ou “Happy Alone” são canções que se acompanham com uma pandeireta imaginária e o final do concerto com o cescendo de “Trany” não podia ter sido mais acertado. Pelo meio houve ainda tempo para a apresentação de temas do novo álbum “A-ha Shake Heartbreaker” (a sair no próximo mês de Novembro) como “4 kicks”, “Razz” e “Pistol of Fire” que têm toda a intensidade necessária para se continuar a gostar dos Kings of Leon, até, quem sabe, em Portugal, numa sala cheia de fumo, longe de um mundo melhor.

Bem conhecidos do público português, os Lali Puna protaganizaram o concerto mais acidentado do festival. Os problemas técnicos do ”Escenário Kane NYC FIB Club”, que se viriam a repetir nos dias seguintes, boicotaram por completo a indietrónica (agora com guitarras) dos Lali Puna que, mesmo assim, se concentrou nos temas do seu mais recente álbum, como por exemplo “B-side” e “Left Handed”. A ausência do órgão, imprescindível na maioria das suas músicas, fez com que se assistisse a um concerto amputado onde o público tinha de imaginar um instrumento. Uma experiência no mínimo interactiva. Um semi-concerto que valerá à simpática vocalista Valerie Trebeljahr o prémio de “artista mais corajoso do FIB”.
Enquanto os Lali Puna lutavam contra a personalidade forte dos instrumentos que teimavam em não funcionar, perante um público fiel, os Tindersticks passeavam os últimos discos pelo palco principal e os Air apresentavam a sua electrónica perfeita e estilizada no “Escenario Hellomoto” completamente cheio. Três concertos em simultâneo a comprovarem a necessidade de super poderes em Benicàssim. Em 2002 os Air tiveram honras de palco principal no encerramento do festival, após uma das sempre enérgicas e veneradas actuações dos Chemical Brothers em Espanha. Este ano, foram recambiados para um espaço menor mas aí provaram continuar a merecer o estatuto de estrelas. O “Escenario Hellomoto” foi pequeno para todos aqueles que desejavam confirmar a qualidade dos temas de “Talkie Walkie” ao vivo. Contudo, os melhores momentos dos concertos dos Air continuam a ser os já clássicos êxitos de Moon Safari, como “Kelly watch the Stars” e “Sexy Boy”. Electrónica matematicamente construída e excitante q.b.

Uma das mais valias do FIB é o facto de conseguir conciliar coerentemente propostas musicais diversificadas. Assim se explica que enquanto a pop britânica já envelhecida dos Charlatans pairava no “Escenario Verde”, o rock industrial dos Einstruzende Neutauben demolisse o “Escenario Kane NYC FIB Club”. Em palco, os instrumentos são autênticas peças de artesanato bizarro que só por si são o prenúncio de um espectáculo único. Será Blixa Bargeld um coleccionador de ferro velho? Já terá abandonado os hábitos de juventude em que um dos seus passatempos era ir para a auto-estrada bater nos rails? Não sabemos, mas o metal continua a ser um dos seus fascínios. Gigantescos compressores de ar, lâminas, placas de metal enormes, caixotes do lixo giratórios... Tudo serve para fazer canções disfarçadas de ruído, como as apoteóticas “Prepetuum Mobile” e “Ich Gehe Jetzt”. Um dos grandes concertos do FIB.
Apesar da intensidade visceral dos Einstruzende Neubauten, o trono de cabeças de cartaz do primeiro dia do FIB 2004 estava reservado para os Pet Shop Boys e para os Kraftwerk.
22 anos depois de se terem formado, os Pet Shop Boys chegaram a Benicàssim para uma retrospectiva dos muitos anos de carreira em doze temas. Aplausos, coros, braços no ar, palmas.. Conscientemente, ou não, toda a gente conhece os temas do duo inglês que desde sempre se soube adaptar às tendências dançáveis do momento, com menos ou maior gosto. Um concerto em tom de greatest hits com o esperado tema “It’s a Sin” a encerrar. Os sintetizadores e os falsetes continuam iguais, as gabardines prateadas podiam figurar no guarda.roupa da Barbie, a simpatia é a esperada e por momentos é bom ter uma imagem daquilo que durante a infância se ouviu nas estações de rádio. Contudo, pode-se adivinhar em toda a encenação indícios de um final de carreira que provavelmente passará pela feira de enchidos da Castanheira, ao lado dos Scorpions e dos Gene Love Jezebel, num futuro próximo.

A encerrar, um capítulo da história da música: Kraftwerk. Robots, mecânicos, frios e sintéticos. O minimalismo dos Kraftwerk é indiscutivelmente uma das maiores influências da electrónica nascida a partir dos anos 70. Mas, durante a sua actuação, perante sons de drum machines em tempos perfeitos somos tentados a pôr em causa o valor da máquina. Não será tudo artificial demais? Não estarão os quatro Kraftwerk, impecavelmente vestidos, a jogar um longo campeonato de copas em rede? Até que ponto é que estas estátuas de cera, em frente aos seus laptops, poderão entusiasmar aqueles que estão lá não só para escutar os temas, mas também para ver e sentir? A componente visual existe. Os quatro membros dos Kraftwerk apresentam-se em frente a enormes projecções meticulosamente estudadas, mas a ausência de improviso pode também ser um ponto desfavorável à sua prestação ao vivo. Os temas não desiludem, soam exactamente como nos registos e nenhum dos esperados faltou, como por exemplo, “The Model”, “Tour de France”, “Radioactivity”, “Music Non Stop” e “Autobahn”. Porém, a frieza dos quatro homens máquina talvez não se coadune com o habitual calor de Benicàssim.

Com a vitória do homem sobre a máquina terminava o primeiro dia de concertos no palco principal do FIB, mas aquilo que distingue o festival espanhol, nomeadamente dos ingleses, é o facto de existirem actuações até às 8 da manhã. Há ainda oportunidade de assistir a actuações de djs menos conhecidos, como o alemão Steve Bug, ao circo dos Le Hammond Inferno ou a uma noite dedicada à editora Bpitch Control, liderada por Ellen Allien, que apresentou o set mais criativo, em que aquilo a que vulgarmente se chama electro apareceu mascarado nas suas mais diversas formas – eletroclash, electropop, electro-qualquer-coisa.

De manhã, com a consciência de um primeiro dia de objectivos cumpridos, as poucas horas de sono que se avizinham são insignificantes perante a expectativa dos muitos concertos que ainda se irão realizar.(JN)
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2024-04-19
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